A leitura deste livro inicia-se de rompante, a uma velocidade narrativa avassaladora. É uma entrada de choque, cheia de humor e vertiginosa na forma como nos faz devorar páginas.
Esta narrativa assume especial importância na forma como retrata a sociedade inglesa atual num subúrbio de Londres. Lionel, que aos 18 anos mudou o seu apelido Pepperdine para Asbo (nome do documento inglês sobejamente seu conhecido, Anti Social Behaviour Order), é um pequeno delinquente que se orgulha de ter começado na senda do crime aos dois anos de idade. Ele tem um coração de pedra, é profundamente sádico e cultiva um gosto especial pela violência, muitas vezes gratuita; é totalmente imbecil no que toca às faculdades intelectuais, em contraste com o seu sobrinho Des, um negro que representa aqui o futuro que a Inglaterra ainda pode ter, em contraste com o desastre que Lionel representa.
A partir de certa altura, o enredo tem uma viragem radical: Lionel, o detestável arruaceiro ganha a lotaria e torna-se multimilionário. Agora, ele convive com a alta sociedade; mas aqui o autor surpreende-nos com a caracterização dessa elite que Lionel encontra no hotel onde se aloja; eles, os ricos cultivam a ignorância e idolatram a violência da mesma forma que a ralé a que Lionel pertencia antes; pobres ou ricos, os ingleses são ignorantes e brutos; parece ser esta a mensagem do autor. Sem dúvida uma crítica social mordaz e impiedosa.
A partir desta viragem no enredo, no entanto, o livro segue um rumo diferente, o ritmo narrativo abranda imenso e a prosa torna-se mais reflexiva e mais séria. A meu ver, isto faz com que a obra perca interesse e qualidade literária; perde-se a emoção e a vertigem narrativa da primeira parte; perde-se, em parte o humor satírico da primeira fase do livro, que se torna sério e às vezes mesmo maçador.
Fica, no entanto, a evidente qualidade da escrita do autor: clara, incisiva, rica em termos de vocabulário e, a sua principal qualidade, bem-humorada. A crítica é incisiva e mordaz; na narrativa “vemos” uma Inglaterra decadente e um povo inglês passivo perante os graves problemas sociais como a exclusão e a forte diferenciação social, a falta de cultura, o culto da violência e da pornografia – Martin Amis afirma que Lionel não consegue viver sem cadeia nem pornografia; a cadeia é vista como a sua segunda casa, de onde sai e volta a entrar com frequência; a pornografia é, para Lionel, a substituta das relações humanas, o que diz muito sobre a forma como Amis aborda este fenómeno social da autoexclusão e consequente refúgio em comportamentos marginais.
Em suma, um livro com muito interesse, bem escrito, que merece uma leitura atenta. E divertida.
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