sexta-feira, 23 de setembro de 2022

Delia Owens - Lá, Onde O Vento Chora


- Bom, nesse caso, o melhor será escondermo-nos bem longe, onde o vento chora. (…)

– Onde o vento chora? O que queres dizer com isso? – A mãe costumava dizer isso. – Kya recordava-se que a mãe estava sempre a encorajá-la a explorar o pantanal. – Vai tão longe quanto puderes, até onde ouvires o vento chorar.

– Significa bem longe, no mato, onde ainda há criaturas selvagens e estas ainda se portam como tal.
” (Página 120)


A narrativa retrata a história de Kya, nascida em 1945, uma menina que vive com os pais e os quatro irmãos num pântano. Aos seis anos a mãe abandona a casa, devido à violência do pai, e a partir daí a vida dela muda para sempre. Os restantes irmãos também acabam por fugir deixando-a sozinha com o pai. Este, vinha para casa às horas que lhe apetecia, geralmente bêbedo, seguido de períodos em que desaparecia durante dias. Kya tem que crescer à força, principalmente após o dia em que o pai também desaparece. Para sobreviver a pequena vende peixe, mexilhões e outras coisas para conseguir ter o que comer. Os anos passam, Kya é posta de parte pelos habitantes do vilarejo, Barkley Cove (Carolina do Norte), que a consideram um bicho do mato, uma selvagem a quem chamam a “miúda do pântano” e aos 24 anos é acusada de matar um jovem com quem teve uma relação íntima.

Os principais intervenientes nesta história são: o casal Saltos (Jumpin', no original) e Mabel, também vítimas do preconceito racial dos habitantes da vila, proprietários da loja onde Kya consegue algum proveito com as vendas que faz; Tate, o primeiro amor de Kya, que a ensina a ler e Chase Andrews, o tal jovem que apareceu morto, desportista, por quem sente mais tarde atração. Entre amores e desamores, aproximações e desilusões, Kya vai aprendendo a desconfiar até da ideia do amor romântico, acreditando que o pântano e o mundo natural (onde “o mar era tenor e as gaivotas soprano” – página 40) é a sua única e mais pura salvação.

O livro tem muito drama, intenso em sensações, pouca ação, que flutua entre o presente e o passado, mas muito bem escrito, de forma fluída e ritmada, envolvendo-nos nas descrições da natureza (fruto da experiência de Delia Owens enquanto zoóloga e cientista da vida selvagem, em África), do sofrimento e intensa solidão, do racismo (na década de 60 a discriminação com base na cor era ainda uma triste e dura realidade nos E.U.A.), da violência doméstica e alcoolismo do pai. Mostra como a personagem Kya, mesmo tendo uma vida agridoce, viu a sua sorte mudar, conseguindo superar obstáculos e sobrevivendo contra todas as expectativas, tornando-se (irrealisticamente) uma autora de renome ao publicar vários livros de Biologia. Para mim, o final da história foi bastante previsível. De lamentar o número escandaloso de erros gramaticais do livro o que é vergonhoso para a tradutora e para a editora.


 

O filme que adaptou a obra para o cinema estreou em Portugal em setembro. Olivia Newman realiza o drama, com Daisy Edgar-Jones, David Strathairn e Taylor John Smith nos principais papéis. A longa metragem é bastante fiel à obra original, alterando apenas a forma como se descobre o autor do crime…

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