quinta-feira, 31 de dezembro de 2020

Os Melhores Filmes de 2020

2020 terá sido, provavelmente, um dos anos mais estranhos da história do cinema, mas não foi por isso que deixou de haver bom cinema para ver. 

A pandemia veio baralhar as contas a todos, e a indústria cinematográfica atravessou um ano atípico mas desafiador, com rodagens e estreias canceladas ou adiadas. Este cenário acabou por possibilitar o fortalecimento dos serviços de streaming. 

O cinema, nos melhores e piores momentos, é um modo de viajarmos sem sair do lugar e descobrirmos outras histórias e realidades possíveis. Na minha opinião, os filmes de 2020 que me proporcionaram as "viagens" mais fascinantes foram:

1. Better Days

Shaonian de ni”, título deste filme de Hong-Kong, realizado por Derek Tsang, onde uma adolescente que sofre de bullying forma uma amizade inesperada com um jovem misterioso que a protege de agressores, enquanto tem de lidar com a pressão dos exames finais do ensino secundário para entrar na universidade. Apesar da excessiva manipulação sentimental, trata-se de uma acutilante história sobre bullying levada à violência extrema. “This used to be our playground”... 
  
 


2. Druk 

Conhecido também por “Another Round” este filme dinamarquês de Thomas Vinterberg também é ambientado numa escola secundária onde quatro professores parecem ter chegado à crise de meia-idade e, numa noite, enquanto afogam as mágoas e partilham as suas histórias infelizes, decidem experimentar um estado de embriaguez (crescente) mesmo quando dão as suas aulas. O filme termina magistralmente ao som de “What a Life” de Scarlet Pleasure.

 


3. Promising Young Woman 

A excelente Cary Mulligan é uma ex-estudante de medicina que, traumatizada por algo que aconteceu à melhor amiga no passado, decidiu largar tudo e ainda não sabe o que fazer da própria vida, exceto aterrorizar homens que tentam abusar dela, fingindo-se de bêbada em bares da cidade. Filme feminista de Emerald Fenell, com um humor sóbrio, por vezes desconcertante mas no final, que é excelente, há uma reviravolta deliciosa de contemplar, tal e qual uma ópera que atinge o seu ápice supremo nos momentos finais...

 


4. Sound Of Metal 

Com uma prestação arrebatadora de Riz Ahmed, este filme de Darius Marder, leva-nos numa viagem sensorial que nos desperta para um mundo pouco representado no cinema onde não há nada mais revelador que o próprio silêncio. Um baterista de uma banda de metal que, subitamente, começa a perder a audição e tem de mudar completamente a sua vida até perceber que existem outras formas de viver...



5. Quo Vadis, Aida?

Co-produção entre nove países europeus, este filme desconcertante de Jasmila Zbanic, baseado em factos verídicos, acompanha a vida de uma professora (a soberba Jasna Djuricic), que também é tradutora das Nações Unidas, e que tenta salvar o marido e os filhos durante o massacre de Srebrenica, em julho de 1995. O filme não é fácil de suportar e só quem se sente mentalmente preparado deve aventurar-se neste flagelo cinematográfico que mostra os horrores do genocídio num dos períodos mais negros na História Europeia após a 2ª Guerra Mundial (neste caso com a inação criminosa das Nações Unidas).

 


6. First Cow 

Belíssimo filme realizado por Kelly Reichardt que conta a história de uma amizade no século XIX, construída nos detalhes e silêncios da rotina de dois homens, Otis “Cookie” Figowitz (John Magaro), padeiro que viaja com um grupo de caçadores e King-Lu (Orion Lee), que decidem roubar o leite da única vaca da região para a produção de doces e que acabam por encontrar, um no outro, o conforto que o verdadeiro companheirismo pode trazer. Construída com a calma do cinema mais contemplativo e “natural”, tanto no sentido de naturalista quanto de ligado à natureza (os animais, as plantas e os humanos), o que poderá afastar muitos espectadores, a longa-metragem logo na imagem inicial revela o destino que aqueles dois homens terão, restando apenas a descoberta das suas circunstâncias exatas. Uma obra profunda ao conseguir debater as injustiças do capitalismo que são refletidas no mundo moderno.

 


7. Corpus Christi 

Filme polaco realizado por Jan Komasa e baseado em factos reais que aborda a religião católica e que investiga em detalhe questões como as vocações e celibato sacerdotal, além da estranha dinâmica social de uma pequena comunidade, que incorpora um novo sacerdote (fabulosa interpretação do jovem protagonista Bartosz Bielenia), que esconde a sua verdadeira identidade.

 


8. I Care A Lot 

O que mais apreciei neste filme de J Blakeson foi a impressionante prestação de Rosamund Pike (aqui é Marla Grayson, uma guardiã do estado que cuida dos mais idosos) e do seu argumento: um médico seleciona um paciente mais idoso, de preferência doente (se for demência melhor ainda), no entanto com sólidas poupanças e bens materiais; depois um juiz assina uma ordem do tribunal que afirma que este idoso não é mais capaz de cuidar dele próprio e é necessário nomear alguém para o fazer; por fim, uma guardiã entra em contacto com o idoso, com a ordem do tribunal a dizer que terá de ir para um lar, mas que a sua casa e os seus bens vão ficar bem entregues. O que menos apreciei foi o fim da história...

 


9. Listen 

Filme muito realista, aborda o drama de um casal português emigrado, a quem os serviços sociais retiram, injustamente, os filhos por suspeitas de maus tratos. O filme de Ana Rocha de Sousa espelha a luta pela união de uma família após um erro irreversível mas também é um filme que tornar-se-ia ainda mais envolvente se adotasse uma estrutura mais complexa. O tema final “Hold My Hand”, cantado por Nessi Gomes, traz toda uma nostalgia que realça os momentos mais duros do filme.

 


10. Never Rarely Sometimes Always 

Este filme sobre amizade, machismo e aborto, constitui uma crítica social contada de uma forma única, crua e transparente. Autumn (Sidney Flanigan), é uma jovem de 17 anos que decide abortar aos 17 anos e conta com o apoio da prima e amiga incondicional Skylar (Talia Ryder). O título do filme de Eliza Hittman corresponde às respostas a um questionário de escolha múltipla sobre experiências potencialmente marcadas pela violência sexual, física ou psicológica, pronunciadas no interrogatório devagar e pesarosamente como uma facada no coração e é quando percebemos o motivo da gravidez ser indesejada. O preenchimento do questionário constitui o momento principal do filme ao revelar todos os medos, aflições e dores da protagonista. Sharon Van Etten participa como atriz (é a mãe de Autumn) e também se ouve na parte final do filme em “Staring At A Montain”.

quarta-feira, 30 de dezembro de 2020

Os Melhores Discos do Ano 2020


E chegámos ao fim de 2020 (finalmente), o ano que vai ser recordado durante bastante tempo e, infelizmente, pelas piores razões. O ano da pandemia dinamitou todos os quadrantes da sociedade e o da cultura foi, claramente, dos mais atingidos. Concertos e festivais cancelados e adiados, músicos sem lugar para ensaiar, gravar e tocar, e um público sem ter acesso aos seus artistas favoritos. Um ano totalmente atípico que, esperamos, não venha a ser igualado no futuro. 

Num ano de muitos discos (e tempo passado em casa para os escutar), aqui fica uma lista dos 20 discos que mais gostei de escutar este ano.


   


- JARV IS... - Beyond the Pale 
- Porridge Radio - Every Bad 
- Fontaines DC - A Hero’s Death 
- Fiona Apple - Fetch the Bolt Cutters 
- Baxter Dury - The Night Chancers 
- Phoebe Bridgers - Punisher 
- Thurston Moore - By the Fire 
- Bob Dylan - Rough and Rowdy Ways 
- Haim - Women in Music Pt. III 
- Moses Sumney - Græ 
- Laura Marling - Song For Our Daughter 
- Bill Callahan - Gold Record 
- Waxahatchee - Saint Cloud 
- Fleet Foxes - Shore 
- The Flaming Lips - American Head 
- Dua Lipa - Future Nostalgia 
- Rufus Wainwright - Unfollow The Rules 
- B Fachada - Rapazes e Raposas 
- Samuel Úria - Canções do Pós-Guerra 
Matt Berninger - Serpentine Prison


 

terça-feira, 29 de dezembro de 2020

As Minhas Melhores Leituras de 2020

1. Elena Ferrante – A Vida Mentirosa dos Adultos 
2. Celeste Ng – Pequenos Fogos em Todo o Lado 
3. Vladimir Nabokov – Contos Completos – Volume 1 
4. Haruki Murakami  Norwegian Wood 
5. Ian McEwan – A Balada de Adam Henry 
6. Javier Cercas – O Impostor 
7. Annie Ernaux – Os Anos 
8. Aravind Adiga – O Tigre Branco 
9. Irene Vallejo – O Infinito Num Junco 
10. Jerry Seinfeld – Isto Tem Piada? 
11. Jón Kalman Stefánsson – Aproximadamente do Tamanho do Infinito 
12. Woody Allen – A Propósito De Nada

domingo, 27 de dezembro de 2020

As Melhores Séries de 2020

Thriller, drama, comédia e ficção científica. Há de tudo nesta seleção das melhores séries. Creio que nunca vi tantas séries de televisão e nunca senti que ficou tanto por ver. É impossível ver tudo. Todos os dias saem novas séries nas várias plataformas de streaming disponíveis em Portugal e foram várias as histórias interessantes que chegaram à televisão nos últimos meses. Esta é a lista (possível) das melhores séries de 2020 a que assisti:


 


1) The Unorthodox

2) Small Axe

3) Pátria

4) Curb Your Enthusiasm (Temporada 10)

5) The Crown (Season 4)

6) Normal People

7) Better Call Saul (Season 5)

8) The Queen’s Gambit

9) Ozark (Season 3)

10) Mrs. America

11) A Teacher

12) The Undoing

13) High Fidelity

14) A Very English Scandal

15) Little Fires Everywhere

16) Ramy (Season 2)

17) The Mandalorian

18) Dave

19) My Brilliant Friend (Season 2)

20) Bridgerton

sexta-feira, 25 de dezembro de 2020

Jesus aguentaria ser professor nos dias de hoje?!



O Sermão da Montanha

Naquele tempo, Jesus subiu a um monte seguido pela multidão e, sentado sobre uma grande pedra, deixou que os seus discípulos e seguidores se aproximassem. Ele preparava-os para serem os educadores capazes de transmitir a Boa Nova a todos os homens. Tomando a palavra, disse-lhes:


- Em verdade, em verdade vos digo: Felizes os pobres de espírito, porque deles é o reino dos céus; Felizes os que têm fome e sede de justiça, porque serão saciados; Felizes os misericordiosos, porque eles...?

Pedro interrompeu-o: 
- Mestre, vamos ter que saber isso de cor?
 
André perguntou:
- É pra copiar?
 
Filipe lamentou-se:
- Esqueci-me do meu papiro!
 
Bartolomeu quis saber:
- Vai sair no teste?
 
João levantou a mão:
- Posso ir à casa de banho?
 
Judas Iscariotes resmungou:
- O que é que a gente vai ganhar com isso?
 
Judas Tadeu defendeu-se:
- Foi o outro Judas que perguntou!
 
Tomé questionou:
- Há alguma fórmula pra provar que isso tá certo?
 
Tiago Maior indagou:
- Vai contar pra nota?
 
Tiago Menor reclamou:
- Não ouvi nada, com esse grandalhão à minha frente!
 
Simão Zelote gritou, nervoso:
- Mas porque é que não dá logo a resposta e pronto!?
 
Mateus queixou-se:
- Eu não percebi nada, ninguém percebeu nada!
 
Um dos fariseus, que nunca tinha estado diante de uma multidão nem ensinado nada a ninguém, tomou a palavra e dirigiu-se a Jesus, dizendo:
- Isso que o senhor está a fazer é uma aula? Onde está a sua planificação e a avaliação diagnóstica? Quais são os objetivos gerais e específicos? Quais são as suas estratégias para recuperação dos conhecimentos prévios?
 
Caifás emendou:
- Fez uma planificação que inclua os temas transversais e as atividades integradoras com outras disciplinas? E os espaços para incluir os parâmetros curriculares gerais? Elaborou os conteúdos conceituais, processuais e atitudinais?
 
 Pilatos, sentado lá no fundo, disse a Jesus:
- Quero ver as avaliações do primeiro, segundo e terceiro períodos, como aplicaram os critérios de avaliação e reservo-me o direito de, no final, aumentar as notas dos seus discípulos para que se cumpram as promessas do Imperador de um ensino de qualidade. Nem pensar em números e estatísticas que coloquem em dúvida a eficácia do nosso projeto. E veja lá se não vai reprovar alguém!
 
E foi nesse momento que Jesus disse: "Senhor, porque me abandonaste?"
 
(Nem Jesus aguentaria ser um professor nos dias de hoje...).

Texto (bastante) adaptado de um site da internet.

quarta-feira, 25 de novembro de 2020

sexta-feira, 13 de novembro de 2020

Sons de Outono

 
1. Porridge Radio - Sweet
2. Phoebe Bridgers - Kyoto
3. Future Islands - Moonlight
4. Winona Oak - She
5. Two Feet - Think I'm Crazy
6. Loma - Ocotillo
7. Fontaines DC - Televised Mind
8. Nothing But Thieves - Phobia
9. Andy Bell - Love Comes In Waves
10. Local Natives (Ft. Sharon Van Etten) - Lemon
11. Angel Olsen - Whole New Mess
12. Eels - Are We Alright Again
13. Deep Sea Diver (Ft. Sharon Van Etten) - Impossible Weight
14. Cage The Elephant - Ready To Let Go
15. Pixies - Hear Me Out
16. Bully - Where To Start
17. Thurston Moore - Hashish
18. Lana Del Rey - Let Me Love You Like A Woman
19. Patrick Watson - Lost With You
20. Billie Eilish - No Time To Die


quinta-feira, 5 de novembro de 2020

domingo, 1 de novembro de 2020

Ian McEwan – A Balada de Adam Henry

 

Ian McEwan apresenta uma prosa habilidosa, onde nenhuma palavra ali está por acaso e os parágrafos sucedem-se sem artifícios ou truques retóricos. Escrito na terceira pessoa, apresenta-nos uma história com laços simples, que se tornam complexos com o desenrolar dos acontecimentos. Os temas centrais são o confronto entre a vida pessoal e a vida profissional, mas também entre a razão científica e o fundamentalismo religioso. Utiliza como pano de fundo o sistema judiciário inglês e uma prestigiada juíza do Supremo Tribunal como protagonista: Fiona Maye, 59 anos, especialista em Direito de Família, e que de acordo com os seus colegas, possui “uma imparcialidade divina e inteligência diabólica”. Tornou-se famosa devido a um caso de gémeos ao aprovar a intervenção cirúrgica que iria separar uns irmãos siameses, provocando o sacrifício de um deles em benefício da sobrevivência do outro.

Apesar de lidar diariamente com a razão em detrimento da emoção, decidindo conflitos e dilemas morais através das suas sentenças, a sua vida pessoal está a passar por uma crise: arrepende-se de não ter tido filhos e o marido, professor universitário de História, coloca-a numa posição de escolha entre uma posição passiva sobre um caso extraconjugal com uma colega do trabalho e o fim do casamento de 35 anos (justificando-se com as suas necessidades sexuais não atendidas nos últimos tempos por Fiona, obcecada pelo trabalho).

É neste ambiente que vai parar às suas mãos um caso de um rapaz, prestes a completar 18 anos, que precisa de uma transfusão de sangue para o tratamento de leucemia. Este rapaz, Adam Henry, cujos pais são Testemunhas de Jeová, não aceita aquela solução e está disposto a “morrer como mártir” pela religião. O momento familiar complicado pelo qual Fiona está a passar faz com que ignore a necessidade de afastamento emocional na batalha jurídica que chamará a atenção da sociedade para um debate sobre o bem-estar do adolescente em confronto com os dogmas religiosos da sua família e assim ela decide ir visitar o jovem Adam ao hospital. Aqui, constata que este tem uma compreensão parcial da situação precária da sua saúde e dos riscos associados e, ao mesmo tempo, uma visão romântica da fatalidade dos efeitos decorrentes da sua orientação religiosa. Escreve poesias que encantam a equipa médica e despertam na experiente juíza um sentimento ambíguo de compaixão maternal (ela decidiu não ter filhos devido à sua carreira) e carência sentimental. Para Adam, “a religião dos meus pais era um veneno e a Fiona foi o antídoto”.

A música erudita tem um lugar de destaque neste romance, constituindo uma válvula de escape para Fiona, uma exímia pianista de peças clássicas de Berlioz e Mahler (no seu belíssimo apartamento tem um piano Fazioli), e também um ponto de aproximação entre ela e o sensível Adam Henry. Também se encontram referências a Bach, Schubert e Scriabin e a dois discos: “Facing You” de Keth Jarrett e “Round Midnight” de Thelonius Monk. Fundamental também é o poema de William Butler Yeats, “Down By the Salley Gardens”.

  


Para quem nunca leu nada deste autor recomendo a leitura de “Amesterdão”, “Expiação” e “Sábado” (preferencialmente por esta ordem).





Quanto ao filme, de 2017, que tem como nome alternativo “My Lady” e segue quase à risca o livro com uma realização muito segura e fiável de Richard Eyre, cenários clássicos, guarda-roupa irrepreensível, tudo “very british” incluindo as cabeleiras dos juízes e uma casa maravilhosamente decorada… Rigor britânico num filme jurídico denso e belo onde a paixão da juventude, que tudo arrebata, coloca as convicções morais e uma vida emocional esfrangalhada em enorme turbação. Quem realmente brilha são os atores que encarnam os diferentes pólos de interesse: a sublime Emma Thompson, mostrando na perfeição as oscilações de Fiona, entre a firmeza da sua racionalidade e a insegurança da sua vida interior (o realizador aproveita para abrir a porta aos sentimentos mais profundos de Fiona); Fionn Whitehead, como Adam Henry, ao conseguir exprimir as suas angústias e desejos, os seus dramas e ambições e a precoce mas encantadora maturidade que tanto encantou a Honourable Mrs Justice Maye e, por fim, Stanley Tucci, ator sóbrio a deslizar naquilo que por vezes se designa classe.

O nome original do filme, “The Children Act” (e também do livro), é uma referência à legislação britânica, de 1989, acerca da proteção de menores. É citando essa lei que Fiona fundamenta a sua decisão: “o bem-estar da criança deve ser o principal fator na ponderação do tribunal”.

Um filme que nos deixa desassossegados e cúmplices e esse é o poder que só os grandes filmes possuem.



sábado, 31 de outubro de 2020

quinta-feira, 15 de outubro de 2020

Concertos de 2019


A pandemia trouxe o isolamento e distanciamento social, mas também trouxe a ausência de concertos ou festivais de música. Ouvir música ao vivo tem sido, desde sempre, uma forma de libertar o corpo e a mente, um local para deixar o stress e recarregar baterias. Assim não é de estranhar que haja saudades do verão quente, servido de muita música ao ar livre e de memórias que nos aguentavam a saudade até ao ano seguinte. 

Relembro AQUI, nesta altura de pandemia os concertos mais memoráveis do ano de 2019: Primavera Sound, Alive, SBSR, Sudoeste, Paredes de Coura, Vilar de Mouros.

sexta-feira, 2 de outubro de 2020

Leituras do Mês


- Ian McEwan - A Balada De Adam Henry
- Roberto Bolaño - O Terceiro Reich
- Maria João Lopo De Carvalho - O Fado Da Severa
- François Bégaudeau - A Turma

Dia Mundial do Sorriso (Best Stand-Up Comedy Specials)


Sorrir é das coisas mais simples, contribui para o nosso bem-estar e para uma vida saudável. E os espetáculos de stand-up vistos no último ano que mais contribuíram para o meu sorriso foram:




- Hasan Minhaj: Homecoming King (2017)

- Jim Jefferies: Bare (2014)

- Hannibal Buress: Comedy Camisado (2016)

- Jim Gaffigan: Beyond The Pale (2006)

- Richard Pryor: Live in Concert (1979)

- Ali Wong: Baby Cobra (2016)

- Patton Oswalt: Annihilation (2017)

- Reggie Watts: Spatial (2016)

- Zach Galifianakis: Live At The Purple Onion (2006)

Jen Kirkman: I’m Gonna Die Alone (And I Feel Fine) (2015)



quinta-feira, 1 de outubro de 2020

quinta-feira, 10 de setembro de 2020

Planeta - Lixeira (Placebo - Life’s What You Make It)

 

Os sinais são cada vez mais preocupantes. Tudo o que se passa no nosso planeta, a sua decadência, tem no Homem o único responsável.

A sociedade de consumo desenfreado, a constante crise económica, a insegurança internacional e o continuado confronto entre as nações, o esbanjador estilo de vida das nações mais avançadas, tudo isso é insustentável para a Terra que assim não se consegue regenerar. O que se passa com o degelo nos polos e os devastadores incêndios na Amazónia – o pulmão natural em vias de colapso final – são exemplos negativos e criminosos de que é (quase) impossível reverter a morte anunciada deste nosso habitat, que já foi um paraíso e que vai sendo transformado numa verdadeira montureira.

O vídeo do tema Life’s What You Make It (cover do tema dos Talk Talk de 1985), da banda inglesa Placebo foi gravado numa das áreas mais poluídas do planeta, em Agbogbloshie, localizado na cidade de Acra, no Gana, onde fica a maior lixeira eletrónica do mundo onde são abandonados milhões de computadores, televisores, impressoras e telemóveis velhos pelos países mais desenvolvidos. A ideia é mostrar como parte da população vive e trabalha neste local e também o quanto nós, seres humanos, descartamos não só o lixo convencional, mas os restos de equipamentos eletrónicos, tão presentes na nossa vida.

O vídeo inicia-se com imagens da linha de produção de uma fábrica de produtos eletrónicos até serem substituídas por imagens de Agbogbloshie, um enorme depósito de resíduos de produtos eletrónicos onde milhares de famílias recolhem sucatas para sobreviver.

No meio da catástrofe humana registada nesse local, as imagens mostram os seus trabalhadores, essencialmente crianças e jovens, em alguns momentos de descontração e alguns deles chegam a cantar, a dançar e a exibirem-se para as câmaras.


quarta-feira, 2 de setembro de 2020

Truman Capote – A Harpa de Ervas

 



Há muito tempo não lia uma obra de prosa tão poética. A escrita de Capote, servida por uma boa tradução nesta edição Sextante, revela uma musicalidade impressionante e o título da obra dá bem o tom dessa música: o vento inclina a erva, fazendo-a soltar uma espécie de zumbido, um conjunto de ecos que parecem sintetizar vozes humanas que cantam em uníssono.

Está dado o mote para um magnífico livro, bem típico da época em que foi escrito, o início dos anos 50 do século passado; época de ilusão e de esperança para muitos mas de pessimismo para outros. Entre esses descrentes, alarmados pelo império do capitalismo, pelo macarthismo cada vez mais violento, pelo racismo e injustiças sociais, encontramos os escritores do movimento “Beat”, como são os casos de Capote e Kerouac.

Neste contexto, este livro é um intenso apelo à liberdade; ao direito que cada um deveria ter à diferença, a comportamentos socialmente atípicos e a todo um conjunto de pensamentos e comportamentos que devem ser respeitados. Assim, as personagens principais deste livro são seres antissociais, pessoas renegadas pela sociedade, perseguidos pela cor da pele, pela “deficiência” ou, como é o caso do narrador, por ter sido abandonado pelos pais. É neste aspeto que o livro é bastante autobiográfico – também Capote foi um jovem rejeitado pelas sociedade, um desenraizado, abandonado pelos pais.

Trata-se então de um livro típico desta época da escrita norte-americana, num belo estilo poético. Não é um livro grande; não é um livro com um grande enredo; mas é uma obra que prima pela beleza da própria escrita e por uma belíssima mensagem de liberdade.

segunda-feira, 17 de agosto de 2020

Explained (Netflix - Season 1 & 2)

Esta série bastante esclarecedora da Netflix explora vários temas, e é perfeita para quem é curioso e gosta de entender um pouco de tudo. Os episódios são muito curtos, raramente atingem os 20 minutos, aborda temas de Economia e Sociologia, como a ascensão da moeda digital, o mercado de ações, o politicamente correto e a disparidade salarial racial mas também explica, por exemplo, a razão do fracasso das dietas, o mundo da música pop coreana, os desportos eletrónicos ou a vida extraterrestre.


 

Season 1

  1. A Disparidade Salarial Racial
  2. ADN Manipulado 
  3. Monogamia
  4. K-Pop 
  5. Criptomoeda
  6. Por Que Falham As Dietas 
  7. O Mercado De Ações
  8. Desportos Eletrónicos 
  9. Vida Extraterrestre 
  10. !
  11. Criquete 
  12. Canábis
  13. Tatuagens 
  14. Astrologia
  15. Será Que Podemos Viver Para Sempre? 
  16. O Orgasmo Feminino
  17. O Politicamente Correto 
  18. Por Que São Mais Baixos Os Salários Das Mulheres
  19. A Crise Mundial Da Água
  20. Música 

Season 2 

  1. Cultos 
  2. Multimilionários 
  3. Inteligência Animal 
  4. Athleisure 
  5. Codificação 
  6. Piratas 
  7. A Próxima Pandemia 
  8. O Futuro Da Carne 
  9. Beleza 
  10. Diamantes

terça-feira, 28 de julho de 2020

Leituras de Verão

- Truman CapoteA Harpa de Ervas 
- Philipp MeyerO Filho 
- Herta MüllerTudo o que Eu Tenho Trago Comigo 
- Jón Kalman StefánssonAproximadamente do Tamanho do Infinito

terça-feira, 14 de julho de 2020

domingo, 10 de maio de 2020

quinta-feira, 23 de abril de 2020

sexta-feira, 17 de abril de 2020

sábado, 4 de abril de 2020

Corona Mixtape


A epidemia de coronavírus pode até sugerir para alguns que o fim do mundo está próximo. Que fique claro: o mundo não vai acabar (mas vai mudar). Na música, no entanto, o apocalipse inspirou e continua a inspirar compositores a descrever como seriam os derradeiros dias do nosso planeta.

Com o estado de emergência a confinar milhões de portugueses em casa, a música pode ganhar nova relevância. Eis uma lista de 65 canções que podem ser banda sonora para os dias da pandemia...

sexta-feira, 3 de abril de 2020

Leituras do Mês

- Alejandro ReyesA Rainha do Cine Roma 
- Siri HustvedtElegia para um Americano 
- Otto PenzlerMulheres Perigosas (Antologia) 
- Vladimir NabokovContos Completos – Volume 1

quinta-feira, 26 de março de 2020

Sons da Primavera

 
1. Two Feet - Maria
2. Baxter Dury - I'm Not Your Dog
3. Haelos - Pray
4. Ttrruuces - Sensations Of Cool
5. Overcoats - Fire & Fury
6. Liam Gallagher - Once
7. Haim - Now I'm In It
8. The National - Never Tear Us Apart
9. White Lies - Tokyo
10. Lemaitre (Ft. Jennie A.) - Closer
11. Coldplay - Trouble In Town
12. Ashe - Moral Of The Story
13. Gnash - T-Shirt
14. Better Oblivion Community Center - Dylan Thomas
15. Matt Berninger - Holes
16. Ex:Re - Romance
17. Depeche Mode - It's No Good
18. Daisy Gray - Wicked Game
19. Leonard Cohen - Happens To The Heart
20. Tindersticks - Willow

  

segunda-feira, 23 de março de 2020

Serial Killers

Há filmes e séries que só queremos ver uma vez. Aliás, há grandes filmes e séries que só queremos ver uma vez. O que separa estas obras da generalidade das criaturas audiovisuais é quase sempre o facto de equivalerem a pesadelos e fotografarem o pior da humanidade, expondo feridas e partilhando traumas.

As próximas linhas são dedicadas aos apaixonados por histórias negras que revelam as mentes perigosas e intrincadas de assassinos. São séries exigentes do ponto de vista emocional mas excelentes!


When They See Us

Baseada na história real de cinco adolescentes negros conhecidos como Central Park Five, a série segue a história de como o grupo de Harlem foi acusado injustamente de violação. A primeira parte da série passa-se num ambiente de 1989, quando foram questionados pela primeira vez sobre o assédio de uma atleta caucasiana no famoso parque de Nova Iorque. A seguir, quatro dos jovens são enviados para um centro de correcção, mas um deles, por já ter 16 anos, é enviado para uma prisão.

A série tem cerca de 5 horas e está dividida em 4 partes. A quarta parte é brutal e é dedicada quase na íntegra à tragédia de Korey Wise (Jharrel Jerome tem um desempenho soberbo) – que em 1989 se deslocou à esquadra apenas para acompanhar um amigo e acabou como o único elemento dos Five julgado como adulto, passando 12 anos da sua vida entre 3 prisões diferentes a tentar sobreviver. Além de Jharrel Jerome também há actuações brilhantes por parte de Felicity Huffman e Vera Farmiga.

É uma reflexão sobre justiça, sobre o medo e sobre abuso de poder. É terapia de choque e formação cívica. Recorda um conjunto de rapazes no lugar errado à hora errada e é a série certa no momento certo, como seriam todos os momentos para relatar uma história assim.




Manhunt: Unabomber

Esta série conta a terrível (e intrigante) história real sobre o terrorista Ted Kaczynski, que ficou conhecido como “Unabomber” por enviar bombas através do correio para as suas vítimas. Entre o final dos anos 1970 e a década de 1990 feriu 23 pessoas e matou outras três.

Manhunt: Unabomber é uma série a duas velocidades. Os últimos meses de caça ao homem, por um lado, mostrando como o FBI procurava um homem ignorante e depois encetou uma busca por um intelecto refinado, capaz de redigir o famoso manifesto enviado ao New York Times. Essa é a primeira mecha da narrativa, que avança, alternando, dois anos para o momento em que é preciso bater o homicida no seu próprio jogo - fazê-lo confessar, evitando que use o palco mediático para pregar à sociedade que considera ser povoada por carneiros dependentes das máquinas.

Com Paul Bettany como o Unabomber e Chris Noth como o agente do FBI que lidera a investigação, a série é protagonizada por Sam Worthington como Jim “Fitz” Fitzgerald, um profiler incorruptível e pioneiro.

Ted Kaczynski matava pelo correio, enviando encomendas armadilhadas. Conseguiu escapar às autoridades durante duas décadas. Visto como um eremita louco, a série inclina o prisma para ver as origens da mente criminosa, mas também a sua sofisticação.




American Crime Story – The Assassination Of Gianni Versace

No dia 15 de Julho de 1997, o estilista Gianni Versace foi assassinado com dois tiros na nuca à porta de sua casa, em Miami. Versace tinha 50 anos. O criminoso, identificado logo no primeiro episódio, Andrew Cunanan, é um serial killer homossexual de 27 anos, que vivia à custa de homens mais velhos e ricos.

A série tem nove episódios. Começa com a morte de Versace e depois anda para trás e para a frente no tempo, ora mostrando como era a vida de Cunanan e outros dos seus crimes, antes de ter morto o estilista, ora centrando-se na caça ao homem pela polícia de Miami.

Édgar Ramirez interpreta Gianni Versace, Ricky Martin personifica o seu namorado, Anthony D’Amico, Darren Criss dá corpo a Andrew Cunanan e Penélope Cruz é Donatella Versace, a irmã do estilista.





Mindhunter - Season 1

Mindhunter
é uma série inspirada na obra "Mind Hunter: Inside The FBI's Elite Serial Crime Unit" de John E. Douglas e Mark Olshaker, agentes do FBI, onde narram as suas pesquisas na área de psicologia criminal. Os seus estudos incluem, em grande parte, entrevistar assassinos em série famosos, em busca de razões para as suas acções, tentando desta forma, nos anos 70, expandir as fronteiras da ciência criminal com um perigoso mergulho no universo da psicologia do assassinato.

Apanhar assassinos em série requer astúcia e assim entrevistar assassinos para perceber o que os move é o mote desta série criada por Joe Penhall e dirigida por David Fincher, entre outros realizadores. Baseada numa história verídica, com assassinos de que já ouvimos falar, Mindhunter centra-se nos agentes Holden Ford (Jonathan Groff) e Bill Tench (Holt McCallany), da Unidade de Ciência Comportamental do FBI, juntamente com a psicóloga Wendy Carr (Anna Torv).

Na 2ª temporada o foco vai para a investigação de homicídios de crianças ocorridos entre 1979 e 1981, em Atlanta, Geórgia, nos EUA.

Uma série negra e tensa, sem nunca ser demasiado explícita.

sexta-feira, 13 de março de 2020

O Mundo às Avessas


Atravessamos um momento de profunda angústia face a uma realidade que poucos pensavam possível. A pandemia do Covid-19 está a afetar de forma profunda a nossa sociedade e terá consequências a longo prazo.

Embora acredite que será possível, num prazo razoável, encontrar uma vacina que poderá impedir a generalização da infeção, até lá os efeitos continuarão a sentir-se. Situações como a de Itália, com o fecho de todo um país, poderão repetir-se noutros países, com consequências profundas no tecido social e económico.

Aparentemente em Portugal, um país de brandos costumes, está a existir alguma dificuldade na perceção real do problema, não se assistindo, de forma generalizada, à adoção dos comportamentos de prevenção adequados.

Notícias a que temos assistido, como o não cumprimento do isolamento social por parte de algumas pessoas, são de uma enorme irresponsabilidade e dificultam, eventualmente de forma definitiva, os esforços de contenção da disseminação da infeção.

Ainda ontem foi noticiado que algumas praias da zona de Lisboa estavam cheias de banhistas e na marginal de Esposende ou da Póvoa de Varzim, ou ainda no Santuário do Sameiro, verificaram-se situações de aglomeração de cidadãos.

Este tipo de comportamento tem de terminar. Deve ser preocupação de todos cumprir e exigir o cumprimento das medidas de prevenção, contribuindo para a consciencialização da sociedade para a dimensão do problema que enfrentamos e para o fim da pandemia.

Quando se assistia a uma recuperação económica generalizada, após uma crise profunda iniciada em 2008, esta pandemia, conjugada com a guerra do petróleo entre a OPEP e a Rússia, constitui a tempestade perfeita que poderá e deverá originar uma nova crise financeira. E, com o crescimento das tendências nacionalistas, a reconfiguração das cadeias de produção, a subida ao poder de personalidades com reduzidas capacidades de enfrentar os problemas, podemos estar a assistir a uma reconfiguração do Mundo a que estamos habituados, com consequências imprevisíveis e possíveis retrocessos civilizacionais.

Esperemos que os políticos que nos governam estejam, desta vez, à altura do desafio.

segunda-feira, 10 de fevereiro de 2020

Haruki Murakami - Norwegian Wood

A morte existe, não como o oposto da vida mas como parte dela” (página 40)


Este foi o primeiro livro de sucesso de Haruki Murakami, publicado em 1987. O título é inspirado numa canção dos Beatles, com o mesmo nome (do álbum de 1965, Rubber Soul) que descreve um caso extraconjugal de John Lennon. A canção apresenta cítaras indianas, bastante melancólicas, e é conhecida pelas suas referências à espiritualidade oriental. A história começa num aeroporto de Hamburgo, onde essa música está a passar nos altifalantes e a partir daí Toru Watanabe (o narrador do livro) começa a refletir sobre a sua vida nos anos 60.

Aos 17 anos, Toru tinha uma relação formidável com o seu melhor amigo, Kizuki que era o alicerce da sua existência, a sua melhor companhia. Numa noite, sem ninguém prever, Kizuki suicida-se. Este é o acontecimento que muda o dia-a-dia de Toru e que potencia uma alteração na forma como este encara o mundo e a vida.

Toru acaba por criar uma forte relação com Naoko, a namorada de Kizuki, por quem se apaixona. Porém, Naoko nunca ultrapassou bem a morte do seu namorado e acaba por ser institucionalizada numa espécie de sanatório moderno, meio alternativo (o sanatório é claramente uma alusão à obra-prima de Thomas Mann, “A Montanha Mágica”, de 1924).

De seguida, acompanhamos Toru na sua entrada na universidade, a lidar com todas as emoções e dúvidas típicas desta fase, e a sua difícil adaptação a esta nova realidade. Durante estes anos da faculdade, Toru conhece Midori, uma rapariga muito especial e excêntrica que se torna a sua melhor amiga.

As paixões de Toru (Naoko e Midori) representam duas forças em confronto: Naoko é a tradição, a calma, a paz. Midori é o futuro, a ambição, a excitação do progresso e do desconhecido. Entre estes dois polos, Toru procura a sua liberdade, a sua afirmação.

A famosa geração de sessenta, também no Japão, vivia numa encruzilhada: os movimentos estudantis em confronto com a geração conservadora dos pais, a geração saída da segunda guerra mundial. Este conflito de gerações (que se sentiu também na Europa) colocava em confronto aqueles que viveram a guerra e construíram a recuperação económica com base numa disciplina férrea e os filhos, protegidos pelos pais mas educados nessa disciplina, condição essencial para o grande objetivo de construir a riqueza material. Foi uma época em que o Japão adotou o modo de vida ocidental, uma época em que as pessoas ouviam Bill Evans, liam Thomas Mann e bebiam muito café.

Ao longo da obra, Murakami encara estes jovens rebeldes (com os quais Toru não se identifica) como pessoas pouco esclarecidas, para quem a rebeldia era um instrumento de afirmação, mais do que de defesa de determinados ideais. A revolta contra a guerra do Vietname ou contra o sistema universitário eram apenas argumentos para uma geração sem ideais.

Se já não bastasse a qualidade da história, Murakami impõe um verdadeiro arsenal cultural em termos de literatura, música e cinema: é uma espécie de charme a mais na literatura dele, com muitas referências musicais e literárias, que permitem ao leitor aproveitar muito além da história e das personagens. Esta é sem dúvida outra das razões pelas quais as obras deste autor me cativam tanto.


 
(Playlist bastante completa das referências musicais)

O livro é extraordinariamente envolvente. Todas as suas personagens são profundas e muito bem construídas. Sem o misticismo e a fantasia dos seus romances posteriores, Murakami constrói um enredo bem mais real e linear que envolve o leitor numa espécie de solidariedade para com Toru. Talvez este personagem tenha bastante de autobiográfico; no entanto, os dilemas de Toru (os amores, as opções de vida, a forma de encarar o futuro e o passado) são os dilemas de todos nós. Por isso nos revemos nele. Como diz Reiko (a voz da razão neste livro): “todos somos imperfeitos num mundo imperfeito” e, por isso, não devemos encarar os nossos dilemas com demasiada seriedade. A vida exige leveza – essa leveza do ser que Murakami transporta de forma encantadora em todos os seus livros.

A escrita é muito clara e objetiva, sem floreados nem metáforas. Em algumas partes, parece mesmo “crua”. É também um livro com uma carga sexual bastante forte mas que dá, de certa forma, veracidade à história - estamos a falar da vida de um adolescente. Aborda temáticas muito fortes como o suicídio, a transição para a vida adulta e o sentido da vida pois mostra-nos como devemos sempre continuar a lutar pela vida, mesmo quando não parece valer a pena. De sermos resilientes e de lutarmos por nós, quando todas as forças nos puxam no sentido inverso.




A adaptação do livro para cinema foi feita por Anh Hung Tran em 2010, e não há grandes surpresas: o guião é muito centrado na obra original do início ao fim, o resultado final é interessante mas tem a desvantagem habitual de muitos factos relevantes serem esquecidos. Neste caso, e como as personagens são extremamente complexas só nos detalhes que constam do livro é que percebemos melhor a personalidade de cada um deles. No entanto, o filme vale a pena ser visto também pelo desempenho Ken’ichi Matsuyama e Rinko Kikuchi, os atores que interpretam os protagonistas. A banda sonora privilegia os saudosos CAN e The Doors.


segunda-feira, 20 de janeiro de 2020

Pensamento do Dia


"Nenhum caminho é longo demais quando um amigo nos acompanha."

sexta-feira, 17 de janeiro de 2020

sexta-feira, 3 de janeiro de 2020

Leituras do Mês

- Lars KeplerStalker 
- Aravind AdigaO Tigre Branco 
- Afonso CruzA Boneca de Kokoschka 
- Ken FollettUma Fortuna Perigosa