quarta-feira, 28 de dezembro de 2022

Os Melhores Discos do Ano 2022


“Tenho o mais simples dos gostos. Satisfaço-me com o melhor”, disse um dia Oscar Wilde. E dirão todos os melómanos de gosto também ele simples. Por isso regresso aqui à música que mais ouvi nos últimos doze meses e organizá-la hierarquicamente, ao meu bel-prazer, é inquestionavelmente uma prática hedonista (e claro está, altamente subjetiva).

O disco mais ouvido foi claramente do duo britânico Wet Leg, composto Rhian Teasdale e Hester Chambers e oriundo da ilha de Wight, que inclui canções como "Wet Dream", "Ur Mum", "Angelica", "Being In Love" ou a perfeita “Chaise Longue”, uma das mais trepidantes canções que o rock nos ofereceu nos últimos anos. Em tom infinitamente “blasé”, o duo canta com languidez sobre o malogro das notas escolares, a vontade escapista e a irreprimível vontade de se estender horas a fio numa “chaise longue”, o objeto mais adorado por qualquer preguiçoso que se preze.




- Wet Leg - Wet Leg
- Black Country, New Road - Ants From Up There
- Angel Olsen - Big Time
- Spiritualized - Everything Was Beautiful
- The Smile - A Light for Attracting Attention
- Beach House - Once Twice Melody
- Oumou Sangaré - Timbuktu
- Weyes Blood - And in the Darkness, Hearts Aglow
- Yeah Yeah Yeahs - Cool It Down
- Vieux Farka Touré & Khruangbin - Ali
- Arctic Monkeys - The Car
- Julia Jacklin - Pre Pleasure
- Fontaines D.C. - Skinty Fia




Segue ainda uma playlist com temas que marcaram 2022:

terça-feira, 27 de dezembro de 2022

As Melhores Séries de 2022


O ano foi rico em diversidade de estreias nas plataformas de streaming, do sci-fi à espionagem, das fraudes à fantasia. Com interpretações de luxo, argumentos de peso e histórias mirabolantes, estas são as séries que mais gostei de ver em 2022.



- Black Bird – Protagonizada por Taron Egerton e um assombroso Paul Walter Hauser, esta minissérie conta a história real de James Keene, carismático criminoso recrutado pelo FBI para arrancar uma confissão a Larry Hall, homem obcecado pela guerra civil norte-americana que se revelou um dos assassinos em série mais mortíferos da história dos Estados Unidos. Um dos últimos papéis do malogrado Ray Liotta.



- The Dropout – Uma história real (e inacreditável) sobre ambição e fama, e o que pode daí correr mal, “The Dropout: A História de uma Fraude” conta a história de Elizabeth Holmes (a espetacular Amanda Seyfried), fundadora da Theranos. Na tentativa de revolucionar a indústria da saúde, Elizabeth deixa a faculdade (daí o título da série) e inicia uma empresa de tecnologia que tem por objetivo criar uma máquina que, através de uma única gota de sangue, conseguisse efetuar mais de 200 análises. A banda sonora é brilhante e pode ser ouvida AQUI.

- The Bear – O título desta minissérie é a alcunha dada a Carmen Berzatto, um chef Michelin que se vê na posição de gerir a loja de sandes do irmão, depois de este falecer. É uma série caótica mas viciante, decorre numa atmosfera eletrizante, ao som de “New Noise” dos Refused, tem um elenco brilhante e capta o caos frenético que se apodera da cozinha de um restaurante durante o serviço. Os 8 (curtos) episódios devem ser degustados de enfiada…

- Pachinko – Baseada no bestseller de Min Jin Lee e adaptada por um filho de imigrantes coreanos, em “Pachinko” (uma máquina de flippers à japonesa, que aqui funciona como metáfora para a vida, ela própria uma espécie de montanha-russa diária), o espetador perde-se na belíssima fotografia deste retrato emocional e expressivo da história de todos os coreanos que foram afetados pela colonização japonesa da Coreia no séc. XX.

- Severance – Nesta espécie de comédia bizarra, tenta-se responder essencialmente a uma questão (que depois se desmultiplica): e se conseguíssemos separar a nossa vida pessoal da profissional através de consciências distintas? Independentemente dos motivos, se a tecnologia permitir separar o nosso “eu” pessoal do “eu” do trabalho, será que o fazíamos? Será que conseguíamos simplesmente esquecer oito horas do nosso dia? E, a ser possível, seria sequer ético? Onde é que encaixa aqui o nosso livre-arbítrio?

- The White Lotus (Season 2) – Depois de uma temporada inagural de sucesso, a segunda temporada repete a base satírica mas mudam os ingredientes. A exceção é Jennifer Coolidge, que volta a dar vida a Tanya McQuoid. Neste novo “White Lotus”, as personagens desembarcam na Sicília, num ambiente distópico que sufoca as suas relações interpessoais. Conduzido por um brilhantismo de autor, desta vez o enredo assenta na toxicidade e sexualidade. No desfecho, tudo corre bem porque tudo corre mal.

Wednesday – Série com gostinho especial pelo macabro e sobrenatural, spin-off da “The Addams Family”, realizada por Tim Burton e por isso ideal para os fãs da estética sombria. Jenny Ortega interpreta a protagonista da história, Wednesday, alérgica a cor e de olhar intimidante, quase desconcertante, que é expulsa da escola e enviada para onde os pais estudaram e se apaixonaram. É lá que aprende a lidar com as suas visões e é educada para ser independente e corajosa mas acaba por ser obrigada a investigar um crime e ser confrontada com algo que abomina: a amizade e o amor.


Momento impressionate da temporada: a dança de Wednesday ao som de “Goo Goo Muck”, dos Cramps, no baile do liceu. Aliás, toda a banda sonora é simplesmente arrepiante. Wednesday é um ás no violoncello e toca, por exemplo, “Winter” de Vivaldi, e uma versão da “Paint It Black”, dos Rolling Stones. 

Bad Sisters – É uma comédia negra sobre as irmãs Garvey. Desde muito cedo, as cinco irmãs tornaram-se inseparáveis devido à morte prematura dos pais. No entanto, quando uma deles, Grace, é vítima de violência doméstica pelo marido, as irmãs decidem resolver o problema com as próprias mãos, levando a consequências desastrosas.


 

- Inventing Anna – Aqui retrata-se a história verídica de Anna Sorokin (papel desempenhado na perfeição por Julia Garner), uma cidadã russa que, entre 2013 e 2017, se fez passar por uma rica herdeira nos E.U.A., enganando e vigarizando pessoas, bancos, hotéis e outras instituições, até ser finalmente presa (mas libertada no dia 5 de outubro de 2022, precisamente na semana em que vi esta minissérie). 

- The Old Man – Um ex-agente reformado da CIA, Dan Chase (Jeff Bridges) a tentar ter uma vida tranquila até que um dia sofre uma tentativa de homicídio e percebe que está a ser caçado. Assim é obrigado a procurar um esconderijo para se proteger daqueles que o querem matar e encontra-o na casa de Zoe McDonald (Amy Brenneman), uma mulher com um passado misterioso e juntos procuram à verdade sobre a caça a Chase.



- This Is Going to Hurt – comédia dramática que acompanha um grupo de doutores recém-formados num hospital londrino na área da obstetrícia e ginecologia. Esta comédia dramática proporciona um olhar divertido e honesto sobre como é trabalhar com essas especialidades da medicina e explora os efeitos emocionais que trabalhar na área da saúde causa nos seus funcionários. Crítica social e humor. É uma minissérie profundamente humana e imperdível.

- MO – É um divertido e comovente retrato da vida de um refugiado palestino nos EUA. Série criada por Mo Amer e Ramy Youssef (de outra excelente série, “Ramy”) e por isso autobiográfica: acompanha Mo e a sua família, refugiados do Iraque durante a Guerra do Golfo, no início dos anos 90, em busca da obtenção da cidadania americana.

Hacks (Season 2) – Série hilariante sobre uma comediante lendária de Las Vegas, pioneira mas ultrapassada, Deborah Vance (Jean Smart). A história explora a relação de mentoria que Deborah estabelece com Ava Daniels (Hannah Einbinder), uma jovem escritora de comédia. Nesta segunda temporada, Deborah, no crepúsculo da sua carreira, decide retornar às suas raízes e fazer espetáculos itinerantes pelos E.U.A.

Heartstopper – A novela gráfica passa para o pequeno ecrã, a história de amor de Charlie Spring (Joe Locke) e Nick Nelson (Kit Connor), onde os dois adolescentes tentam compreender o sentimento que os une enquanto um lida com o bullying de que é alvo e o outro com incertezas quanto à sua orientação sexual. “Heartstopper” mostra que nem sempre o lado mais negro vinga nas vidas de uma imensa, e diversa, minoria, que continua estigmatizada e perseguida. A participação especial de Olivia Colman é a cereja no topo do bolo.



- Shining GirlsThriller original que combina de forma inteligente elementos sobrenaturais, terror, serial killer, muito suspense e ficção científica. Conta com um elenco encabeçado pela incomparável Elizabeth Moss, Wagner Moura e Jamie Bell. O última episódio termina com a voz de Angel Olsen numa versão de "One Too Many Mornings", original de Bob Dylan.

Menções honrosas para a minissérie The English (protagonizada por Emily Blunt), para a continuação de The Crown (Season 5), Reservation Dogs (Season 3) e Abbott Elementary (Season 2) e para o final da excelente Better Call Daul (Season 6), proveniente do universo Breaking Bad. No mundo da fantasia, além da já mencionada Wednesday é impossível não destacar as majestosas House of the Dragon e The Lord of the Rings: The Rings of Power.

segunda-feira, 26 de dezembro de 2022

As Minhas Melhores Leituras de 2022


1. Chimamanda Ngozi Adichie – Meio Sol Amarelo
2. Bernardine Evaristo – Rapariga Mulher Outra
3. Gerrit Komrij – Um Almoço De Negócios Em Sintra
4. Salman Rushdie – Quichotte
5. Viet Tranh Nguyen – O Simpatizante
6. Juan Gabriel Vásquez – O Barulho Das Coisas Ao Cair
7. Margaret Atwood – Grace
8. António Mega Ferreira – Desamigados Ou Como Cancelar Amizades Sem Carregar No Botão
9. Michel Houellebecq – Serotonina
10. Marieke Lucas Rijneveld – O Desassossego da Noite
11. Irène Némirovski – Suite Francesa
12. Tennessee Williams – A Noite Da Iguana E Outras Histórias
 


Os Melhores Filmes de 2022


O cinema, nos melhores e piores momentos, é um modo de viajarmos sem sair do lugar e descobrirmos outras histórias e realidades possíveis. As minhas 10 melhores viagens em 2022 foram:

1. The Fabelmans, de Steven Spielberg - história semiautobiográfica com a qual Spielberg nos convida a redescobrir a arte e a magia do cinema. Tem como ponto de partida a história da sua juventude: um menino judeu que fica obcecado pelo cinema a partir do momento em que os pais, imigrantes judeus russos nos E.U.A., o levam a ver um filme de Cecil B. DeMille, “The Greatest Show on Earth”, no ano de 1952. Os pais do miúdo, Michelle Williams e Paul Dano, estão sublimes e há David Lynch a fazer de John Ford… 




2. Tár, de Todd Field - filme sobre a fictícia Lydia Tár (mais uma excelente interpretação de Cate Blanchett), uma aclamada compositora que se torna a primeira maestrina feminina de uma orquestra alemã. Acompanha-se a sua vida quotidiana em Berlim, as relações abusivas, a gravação da sua última sinfonia e a sua decadência devido ao seu histórico de comportamentos controladores, abusivos e narcisistas. Excelente!




3. Onoda, 10 000 Nuits Dans La Jungle (Onoda - 10 000 Noites Na Selva), de Arthur Harari - história de um militar japonês da II Guerra Mundial, treinado por um programa secreto dos comandos do exército nipónico e enviado para as Filipinas, para uma ilha montanhosa do arquipélago de Lubang, escassamente povoada por camponeses. Durante quase três décadas manteve-se escondido, ignorando o fim do conflito. O filme levanta muitas questões ainda hoje difíceis de abordar no Japão: a guerra, a derrota, o patriotismo e o fim do Império.


4. Guillermo del Toro’s Pinocchio - o icónico cineasta Guillermo del Toro dá-nos a sua própria perspetiva da intemporal narrativa “Pinóquio” (criada por Carlo Collodi) com uma animação em stop-motion. A ação decorre na Itália fascista de Mussolini, contém algumas liberdades criativas e rumos intrigantes. Adorei!


5. Good Luck to You, Leo Grande (Boa Sorte, Leo Grande), de Sophie Hyde - filme com a brilhante Emma Thompson já AQUI mencionado.


6. All Quiet on the Western Front (A Oeste Nada de Novo), de Edward Berger - baseado no livro icónico de Erich Maria Remarque, publicado em 1929 e já adaptado ao cinema em 1930 e 1970. O filme foca-se num jovem soldado alemão durante a Primeira Guerra Mundial. É uma história sobre os horrores na linha da frente.




7. Argentina, 1985, de Santiago Mitre - filme político onde aspetos públicos e privados dos seus personagens alternam-se e complementam-se numa abordagem bastante ampla de dois grandes temas de uma enorme atualidade: os direitos humanos e a justiça. Inspira-se na história real de Julio Strassera, Luis Moreno Ocampo e a sua jovem equipa jurídica que se atreveram a acusar, contra todos os ventos e marés, a contrarelógio e debaixo de constantes ameaças, a sangrenta ditadura militar argentina, entre 1976 e 1983.


8. Elvis, de Baz Luhrmann – história da carreira de Elvis Presley (Austin Butler) em pouco mais de duas horas e meia. Filme com boas interpretações, que nos dá uma boa panorâmica biográfica da vida de Elvis, proporciona bons momentos musicais e mostra-nos o lado sórdido da sua carreira, bem patente na exploração do seu agente que poucos devem conhecer, o coronel Tom Parker (Tom Hanks).




9. Triangle of Sadness (Triângulo da Tristeza), de Ruben Östlund - sátira ao capitalismo e aos jogos de poder que resulta num filme de chorar a rir do princípio ao fim e que por isso se revela uma sólida chamada de atenção ao capitalismo crescente e à sociedade do consumo.


10. An Cailín Ciúin (The Quiet Girl), de Colm Bairéad - história absurdamente triste passada na Irlanda em 1981. Cáit, de nove anos, a menina do título do filme, contraria as adversidades de uma vida pobre num meio rural ao ser uma observadora sensível da beleza das pequenas coisas ao seu redor. Quando é “despachada” pela sua família sobrecarregada, muitas vezes emocionalmente fria, para um casal mais velho e sem filhos, experimenta um profundo afeto, talvez pela primeira vez…

quinta-feira, 22 de dezembro de 2022

sexta-feira, 9 de dezembro de 2022

quinta-feira, 1 de dezembro de 2022

Leituras do Mês

 



- António Mega FerreiraDesamigados Ou Como Cancelar Amizades Sem Carregar No Botão
- Gerrit KomrijUm Almoço De Negócios Em Sintra
- Yukio MishimaVida À Venda
- Julian BarnesO Ruído do Tempo

terça-feira, 15 de novembro de 2022

Cinema do Mundo

Felizmente, e apesar da hegemonia de Hollywood, a sétima arte existe e floresce em quase todo o mundo, desde as mais empobrecidas nações do terceiro mundo até às mais poderosas potências económicas:

 
- L'Incroyable Histoire Du Facteur Cheval (A Incrível História do Carteiro Cheval), de Nils Tavernier – França (2018)

Esta longa-metragem é dedicada à vida real do carteiro francês Ferdinand Cheval (1836-1924), interpretado genialmente por Jacques Gamblin. Um carteiro solitário que encontra a mulher da sua vida, Philomène (a encantadora Laetitia Casta) e dessa união nasce Alice, que Ferdinand ama mais do que tudo e por ela lança-se numa tarefa de loucos: construir-lhe com as suas próprias mãos um incrível palácio. Não se deixando abater nunca pelos azares da vida, este homem banal não se deixará afetar e consagrará 33 anos da sua vida a esculpir esta obra extraordinária: “O Palácio Ideal”, em Châteauneuf-de-Galaure, na região de Drôme. Inteiramente construído de pedras que encontrou perta da sua casa, o gigantesco palácio é decorado com esculturas de animais, fadas e seres mitológicos. Um monumento que pode ser visitado em Hauterives, França.




- Verdens Verste Menneske (A Pior Pessoa do Mundo), de Joachim Trier – Noruega (2021)

Neste filme, Julie (Renate Reinsve) é uma norueguesa que está a chegar à casa dos 30 anos mas que tem dúvidas em assentar, como o namorado deseja. O encontro com outro homem, por quem se apaixona, vem ainda complicar os problemas existenciais de uma jovem mulher que se sente “a pior pessoa do mundo”, uma personagem secundária na sua própria vida que nunca soube muito bem o que quer da vida: quando a vemos pela primeira vez, somos informados de que é uma brilhante aluna de medicina; logo depois, muda para psicologia para, em seguida, saltar para fotografia, acabando a trabalhar numa livraria; vai tendo uns romances, incluindo com professores, até conhecer Aksel, autor de banda desenhada, com quem passa alguns anos até se apaixonar por Eivind, e onde a sua ideia sobre maternidade oscila entre a rejeição e o desejo.

Estruturado em 12 capítulos, como um livro, e com momentos mágicos de criação cinematográfica – como quando tudo para à volta de Julie e só ela se move – “A Pior Pessoa do Mundo” é uma forma divertida, simples e honesta de nos encontrarmos com nós próprios e recorda-nos que o cinema é ainda uma arte de contar histórias.




- È Stata La Mano Di Dio (A Mão de Deus), de Paolo Sorrentino – Itália (2021)

Filme com uma belíssima fotografia e profundamente autobiográfico pois Sorrentino evoca a sua juventude na Nápoles da década de 80, quando Diego Maradona foi jogar para o clube local, a sua vasta família, a tragédia que o deixou e aos irmãos órfãos e a sua decisão de ser cineasta. É o jovem Fabietto que representa a versão ficcionada do realizador nesta jornada existencialista. Além de Fellini, sempre citado, é inevitável recordar Ettore Scola e o seu filme "La Famiglia" (1987) no qual, mais do que contar a história de uma família, assistimos à declaração de amor incondicional e tolerância que devem ser (teoricamente) as principais características de uma família. Belíssimo filme!




- A Vida Invisível (de Eurídice Gusmão), de Karim Aïnouz (Brasil, 2021) 

É um melodrama tropical muito bem interpretado e dirigido. Passa-se na década de 50 do século passado e é um retrato de vidas reprimidas: histórias paralelas de duas jovens irmãs inseparáveis, Eurídice que sonha em ser uma pianista de renome e Guida que procura um amor verdadeiro, descendentes de uma família portuguesa bastante conservadora, que em virtude de uma determinada ocorrência, vêem-se impossibilitadas de comunicar entre si. Ambas lamentam a falta uma da outra, pelo que jamais desistirão de voltar a reencontrar-se. Todavia, e apesar de viverem geograficamente próximas (sem o saberem), tal evento tarda em ocorrer e a tristeza corrói-as lentamente, sendo as cartas que escrevem (e que nunca chegam ao seu destinatário) o único meio que encontraram para (tentar) amenizar a dor/saudade perpétua. Convém ter lenços por perto para assistir até ao fim…




- Persian Lessons (As Lições de Persa), de Vadim Perelman – Alemanha, Bielorrússia, Rússia (2020)

Um filme baseado em factos reais sobre a Segunda Guerra Mundial onde Gilles um jovem judeu belga, é preso pela SS juntamente com outros judeus e enviado para um campo de concentração na Alemanha. Para escapar à execução, ele jura aos guardas que não é judeu, é persa. A mentira salva-o mas Gilles acaba por receber uma missão aparentemente impossível: ensinar Farsi a Koch, o oficial encarregue da cozinha do campo, que sonha abrir um restaurante no Irão depois da guerra terminar. Gilles tem agora de inventar uma língua que não conhece, palavra a palavra. Conforme a relação pouco habitual entre os dois floresce, começa um clima de suspeita e de medo pela descoberta da trama.

Apesar de poucos momentos mais contundentes em termos de violência, não somos poupados dos horrores da guerra e podemos senti-los ao longo de todo o filme, apenas pela observação dos acontecimentos dentro do campo de concentração.

O final do filme é algo que merece especial menção, pois, inesperado, é simplesmente emocionante e espetacular, dando inclusive um maior significado ao filme e resgatando qualquer deslize de roteiro. A derradeira cena (na verdade a penúltima) é uma pérola surpreendente e inesquecível, que coroa de profundidade atemporal esta bela obra.

domingo, 6 de novembro de 2022

RIP Mimi Parker (Low)


Low, a banda formada em 1993, que encena emoções à flor da pele num quase silêncio: melodias simples, harmonias vocais cheias e a bateria de Mimi Parker…

Inscritos numa tendência do rock alternativo que se convencionou chamar ‘slowcore’, assinaram discos importantes nos anos 90 como “I Could Live In Hope” e “Long Division”.

Em 2005, lançariam um dos discos mais marcantes da cena indie norte-americana da primeira década do século XXI, “The Great Destroyer”. Nos anos mais recentes, estenderam a passadeira do rock a territórios mais experimentais com “Double Negative” (2018) e “HEY WHAT”, lançado no ano passado.


sábado, 5 de novembro de 2022

segunda-feira, 31 de outubro de 2022

sexta-feira, 7 de outubro de 2022

Dia Mundial do Sorriso (Best Stand-Up Comedy Specials)


Dizem que sorrir faz bem ao corpo e também à alma e que é o melhor remédio. O sorriso é tão importante que até existe um dia só para ele: na primeira sexta-feira de outubro, é celebrado mundialmente o Dia do Sorriso. E os espetáculos especiais de stand-up que mais me fizeram sorrir no ultimo ano foram:




- Bo Burnham: Inside (2021)

- Jerrod Carmichael: Rothaniel (2022)

- Natalie Palamides: Nate: A One Man Show (2020)

- Nate Bargatze: The Tennessee Kid (2019)

- Mike Birbiglia: The New One (2019)

- Taylor Tomlinson: Quarter-Life Crisis (2020)

- Sheng Wang: Sweet and Juicy (2022)

- David A. Arnold: It Ain’t For the Weak (2022)

- Hannah Gadsby: Douglas (2020)

- Bill Burr: Paper Tiger (2019)

 

quinta-feira, 6 de outubro de 2022

Sons de Outono


1. Puma BlueHounds 
2. Alex Kapranos & Clara Luciani Summer Wine 
3. Arcade FireAs It Was 
4. Lo MoonLoveless 
5. Måneskin If I Can Dream 
6. The Saint JohnsYour Head And Your Heart 
7. 070 ShakeCocoon 
8. Gorillaz (Ft. Thundercat) Cracker Island 
9. CannonsDancing In The Dark 
10. Marcus Mumford Cannibal 
11. Aurora AksnesScarborough Fair 
12. Black Country, New RoadSunglasses 
13. Angel Olsen & Hand HabitsWalls 
14. The National (Ft. Bon Iver)Weird Goodbyes 
15. La FemmeParadigme 
16. Suede She Still Leads Me On 
17. Julia JacklinLove, Try Not To Let Go 
18. Belle And SebastianA Bit Of Previous 
19. Melody Gardot (Ft. António Zambujo)C’Est Magnifique 
20. Fiona AppleAcross The Universe


segunda-feira, 3 de outubro de 2022

Leituras do Mês


- Yoko OgawaA Magia Dos Números 
- Tennessee WilliamsA Noite Da Iguana E Outras Histórias 
- Will SchwalbeOs Livros Do Final Da Tua Vida 
- Jennifer EganA Visita Do Brutamontes

sábado, 1 de outubro de 2022

segunda-feira, 26 de setembro de 2022

Roger Federer - O Ídolo Que Mudou O Desporto


Roger Federer, um dos desportistas mais icónicos dos primeiros 20 anos deste século e seguramente o que mais extravasou a esfera da história do ténis, pendurou as raquetes na Laver Cup no passado fim de semana.

O lendário tenista suíço despede-se dos courts com 310 semanas no topo do ranking, 20 títulos de Grand Slam, duas medalhas olímpicas, 103 títulos de singulares e 1251 vitórias em encontros individuais. E agora? O que será do ténis sem ele?


sábado, 24 de setembro de 2022

Good Luck To You, Leo Grande




"Boa Sorte, Leo Grande", filme da realizadora australiana Sophie Hyde e da argumentista e atriz britânica Katy Brand, oferece-nos um olhar íntimo sobre a sexualidade. Emma Thompson desempenha o papel principal (o que só por si já seria suficiente para ver o filme), de uma professora de Religião e Moral reformada, viúva e insatisfeita, que não tendo tido outro parceiro sexual na sua vida para além do marido (conservador e pouco preocupado com o prazer feminino), decide contratar um trabalhador do sexo que dá pelo nome de Leo Grande (Daryl McCormack). Leo é uma pessoa agradável e segura de si, e embora nem sempre diga a verdade, Nancy descobre que gosta dele e consegue efetivamente estabelecer uma relação íntima. O jovem que lhe entra no quarto de hotel acaba por ir contra os seus mais profundos preconceitos e a sua história de vida fá-la repensar a sua própria relação com os filhos.

Com diálogos magistrais e uma forte componente dramática, introspectiva e até humorística, "Boa Sorte, Leo Grande" é um filme que fala sobre desconstrução. Sobre como é libertador desfazermos os rígidos condicionamentos culturais, morais e patriarcais que nos apertam e reduzem. Como pode ser transformador olharmos ao espelho, despidos dos filtros de sempre, e olhar para o outro com as lentes limpas (de medo, de vergonha e de culpa). Como pode ser revolucionário que uma mulher madura se sinta no direito de sentir desejo, prazer e vontade de o dizer em voz alta. E como é surpreendente isso ser tão novo no cinema.




Esta comédia intimista dramática de exceção entra para a minha lista de filmes preferidos que decorrem num único cenário (neste caso um quarto de hotel e apenas dois atores) e que nem por isso deixam de ser excelentes. Os outros filmes que constam dessa lista e o respetivo cenário único são:

- Rear Window – Janela Indiscreta (1954) – apartamento;

- Carnage - O Deus da Carnificina (2011) – sala de jantar;

- Amour – Amor (2012) – apartamento;

- Locke (2013) – carro;

- Phone Booth (2002) – cabine telefónica;

- 12 Angry Men – Doze Homens em Fúria (1957) – sala de um tribunal;

- Den skyldige (2018) – central de chamadas de emergência;

- Buried – Enterrado (2010) – interior de um caixão;

- My Dinner with Andre (1981) – restaurante.

- The Desperate Hour (2021) – sessão de jogging.

sexta-feira, 23 de setembro de 2022

Delia Owens - Lá, Onde O Vento Chora


- Bom, nesse caso, o melhor será escondermo-nos bem longe, onde o vento chora. (…)

– Onde o vento chora? O que queres dizer com isso? – A mãe costumava dizer isso. – Kya recordava-se que a mãe estava sempre a encorajá-la a explorar o pantanal. – Vai tão longe quanto puderes, até onde ouvires o vento chorar.

– Significa bem longe, no mato, onde ainda há criaturas selvagens e estas ainda se portam como tal.
” (Página 120)


A narrativa retrata a história de Kya, nascida em 1945, uma menina que vive com os pais e os quatro irmãos num pântano. Aos seis anos a mãe abandona a casa, devido à violência do pai, e a partir daí a vida dela muda para sempre. Os restantes irmãos também acabam por fugir deixando-a sozinha com o pai. Este, vinha para casa às horas que lhe apetecia, geralmente bêbedo, seguido de períodos em que desaparecia durante dias. Kya tem que crescer à força, principalmente após o dia em que o pai também desaparece. Para sobreviver a pequena vende peixe, mexilhões e outras coisas para conseguir ter o que comer. Os anos passam, Kya é posta de parte pelos habitantes do vilarejo, Barkley Cove (Carolina do Norte), que a consideram um bicho do mato, uma selvagem a quem chamam a “miúda do pântano” e aos 24 anos é acusada de matar um jovem com quem teve uma relação íntima.

Os principais intervenientes nesta história são: o casal Saltos (Jumpin', no original) e Mabel, também vítimas do preconceito racial dos habitantes da vila, proprietários da loja onde Kya consegue algum proveito com as vendas que faz; Tate, o primeiro amor de Kya, que a ensina a ler e Chase Andrews, o tal jovem que apareceu morto, desportista, por quem sente mais tarde atração. Entre amores e desamores, aproximações e desilusões, Kya vai aprendendo a desconfiar até da ideia do amor romântico, acreditando que o pântano e o mundo natural (onde “o mar era tenor e as gaivotas soprano” – página 40) é a sua única e mais pura salvação.

O livro tem muito drama, intenso em sensações, pouca ação, que flutua entre o presente e o passado, mas muito bem escrito, de forma fluída e ritmada, envolvendo-nos nas descrições da natureza (fruto da experiência de Delia Owens enquanto zoóloga e cientista da vida selvagem, em África), do sofrimento e intensa solidão, do racismo (na década de 60 a discriminação com base na cor era ainda uma triste e dura realidade nos E.U.A.), da violência doméstica e alcoolismo do pai. Mostra como a personagem Kya, mesmo tendo uma vida agridoce, viu a sua sorte mudar, conseguindo superar obstáculos e sobrevivendo contra todas as expectativas, tornando-se (irrealisticamente) uma autora de renome ao publicar vários livros de Biologia. Para mim, o final da história foi bastante previsível. De lamentar o número escandaloso de erros gramaticais do livro o que é vergonhoso para a tradutora e para a editora.


 

O filme que adaptou a obra para o cinema estreou em Portugal em setembro. Olivia Newman realiza o drama, com Daisy Edgar-Jones, David Strathairn e Taylor John Smith nos principais papéis. A longa metragem é bastante fiel à obra original, alterando apenas a forma como se descobre o autor do crime…

quinta-feira, 1 de setembro de 2022

domingo, 24 de julho de 2022

ESFH: Na senda da excelência!

Disciplina de Economia: 76ª posição a nível nacional, melhor escola pública do distrito de Braga e excelente posição ao nível da escola! (fonte: Jornal Público)




Que orgulho ter contribuído para a obtenção de um excelente resultado nos rankings dos exames nacionais na disciplina de Economia na ESFH. Bom trabalho e parabéns 11CSE1 e 11CSE2, por estes dois anos em que tive o prazer de trabalhar convosco.

Uma escola é uma organização que deve ter o sucesso dos seus alunos como principal missão. Esta ambição pressupõe o prosseguimento dos diversos princípios e valores: oferecer um ensino de qualidade que prepare os alunos para a vida, facilitando o prosseguimento de estudos e a inserção na sociedade, enquanto cidadãos ativos e responsáveis, e que não se baseie no facilitismo; promover a equidade, criando condições para a igualdade de oportunidades; sobrepor os procedimentos pedagógicos e científicos aos procedimentos instrumentais e administrativos; promover hábitos de vida saudáveis, responsáveis, autónomos e solidários; estimular o exercício dos direitos e deveres de cidadania, no respeito pela diversidade, com espírito democrático, pluralista, crítico e criativo. Os alunos devem estar sempre em primeiro lugar, os professores e os seus interesses nunca se devem sobrepor aos dos alunos. A educação é a base de desenvolvimento de uma nação. Parabéns, ESFH.

sexta-feira, 15 de julho de 2022

Irène Némirovski - Suite Francesa


A “Suite Francesa” foi escrito em segredo, quando os nazis ocuparam a França em plena Segunda Guerra Mundial. Nunca foi acabado pois a autora de origem judia, Irène Némirovsky, foi enviada para Auschwitz em 1942, onde foi morta à chegada. O manuscrito permaneceu ignorado durante quase sessenta anos, até ser redescoberto pela filha e acabou por ser publicado em 2004.

Irène Némirovsky pretendia criar um épico sobre o Holocausto. A obra seria composta por cinco volumes na sua totalidade (concebido segundo uma estrutura inspirada na quinta sinfonia de Beethoven). Concluiria apenas os dois primeiros, deixando notas manuscritas, contendo as linhas mestras para a compilação de um terceiro, pouco antes de ser deportada para Auschwitz.

A primeira parte do romance, intitulada “Tempestade em Junho” retrata, com uma lucidez espantosa, o panorama da desagregação económica francesa, como resultado da Grande Depressão dos anos 30, à escala global - uma situação que foi aproveitada pela demagogia ideológica subjacente à propaganda do partido nazi, o qual encontrou nessa fragilidade a oportunidade perfeita para dar largas aos seus objectivos expansionistas.

O local da acção, nesta primeira parte, situa-se na cidade de Paris, logo após ser declarada a guerra. Irène Némirovsky, descreve-nos alguns quadros do quotidiano doméstico em diversos lares – desde o abastado banqueiro Corbin, ao já idoso casal de classe média (funcionários bancários), os Michaud, passando pela família Péricand, situada no limiar que separa a classe média-alta da alta-baixa e pelo pretensioso escritor de massas especializado em folhetins, Gabriel Corte.

A maior parte das personagens de Némirovsky são, nesta primeira parte, não exactamente más, mas de carácter medíocre. A autora critica severamente a atitude hipócrita (colaboradores e delatores) da maior parte da população francesa.

(Fotografia de Irène Némirovsky, aos 25 anos de idade, em 1928)

Na segunda parte, “Dolce”, a história desenrola-se essencialmente em duas casas: a casa dos Angellier e a casa dos Labarie. Lucille Angellier é uma mulher que espera notícias do seu marido (a cumprir serviço militar), enquanto habita com a senhora Angellier, a sua sogra, uma mulher fria, algo austera de sentimentos, pronta a impor as suas decisões e opiniões e que procura que Lucille aprenda a gerir os negócios da família, tais como recolher as verbas aos rendeiros que trabalham nas terras possuídas pelos Angellier. Tudo muda no quotidiano de Lucille quando os alemães invadem a França, em particular o território de Bussy. Os aviões começam por bombardear o comboio e o espaço campestre, com o pânico a ser geral. Chegam tanques, soldados enfileirados, quase todos frios e unidimensionais. A excepção é um alemão sensível, culto e educado – Bruno von Falk – que é utilizado como contraponto face a outras figuras do exército ocupante como, por exemplo, Kurt Bonnet, o tenente intérprete do Kommandantur fascinado por pintura flamenga.

Aquele facto não implica necessariamente que a autora simpatize com os alemães. Na realidade, na altura em que Némirovsky escreve estes capítulos, as pessoas ainda não têm consciência do perigo do nazismo, nem estão na posse da totalidade dos acontecimentos a nível global.

Esta edição de “Suite Francesa” (nome da partitura dedicada a Lucille e elaborada por Bruno, um compositor antes de ser militar) termina com as anotações da autora, para os volumes seguintes, seguida da troca de correspondência entre os membros da família e os amigos da escritora no sentido de mover influências para descobrir o seu paradeiro após ser deportada e proceder à sua libertação. Informação que só foi conseguida no pós-guerra, ao examinarem os registos do campo de concentração onde deu entrada.


O filme que adoptou esta obra ao cinema foca-se essencialmente na segunda parte do livro (“Dolce”) e na história de Lucille, com o marido ausente em combate e que se apaixona pelo “bom nazi” com quem é obrigada a partilhar a casa.

O elenco é admirável (especialmente Michelle Williams, Kristin Scott Thomas e Matthias Schoenaerts) mas, relativamente ao livro, o retrato não é tão realista, muitas personagens são esquecidas e a narração serve apenas para procurar o impacto emocional que as imagens não chegam a alcançar.

Sabendo tratar-se de uma forma viável de comercialização, o uso da língua inglesa em personagens francesas atribui o seu “quê” de artificialismo para os tempos que decorrem, enquanto o alemão é imaculado (involuntariamente dá a entender que é uma língua enraizada no Mal).

Trata-se claramente de uma situação em que o filme, que conta com a realização insípida de Saul Dibb, não consegue acompanhar a complexidade da obra original apesar dos valores de produção serem elevados.

segunda-feira, 4 de julho de 2022

Sons de 2022

 

O mês de junho está a acabar o que significa que metade de 2022 já passou. E este ano, vários artistas já lançaram álbuns incríveis: os Arcade Fire regressaram ao seu melhor, os Fontaines D.C. nunca soaram tanto a Joy Division, as Wet Leg presentearam-nos com um som fabuloso, os Radiohead apareceram “disfarçados” sob o nome The Smile, a majestosa Florence lançou o seu melhor disco até ao momento, o folk melancólico dos Beach House nunca cansa e os saudosos Belle and Sebastian, Placebo ou Tears For Fears voltaram aos discos. Além disso, os Black Country, New Road conseguiram superar o primeiro álbum, as musas Angel Olsen, Sharon van Etten e Emily Jane White também nos presentearam com novas gravações, tal como os Calexico, Tomberlin, Spiritualized, Jack White, Mitski, Big Thief, Jarvis Cocker e Father John Misty. Que Ano!



domingo, 3 de julho de 2022

Martin Amis - Lionel Asbo

 


A leitura deste livro inicia-se de rompante, a uma velocidade narrativa avassaladora. É uma entrada de choque, cheia de humor e vertiginosa na forma como nos faz devorar páginas.

Esta narrativa assume especial importância na forma como retrata a sociedade inglesa atual num subúrbio de Londres. Lionel, que aos 18 anos mudou o seu apelido Pepperdine para Asbo (nome do documento inglês sobejamente seu conhecido, Anti Social Behaviour Order), é um pequeno delinquente que se orgulha de ter começado na senda do crime aos dois anos de idade. Ele tem um coração de pedra, é profundamente sádico e cultiva um gosto especial pela violência, muitas vezes gratuita; é totalmente imbecil no que toca às faculdades intelectuais, em contraste com o seu sobrinho Des, um negro que representa aqui o futuro que a Inglaterra ainda pode ter, em contraste com o desastre que Lionel representa.

A partir de certa altura, o enredo tem uma viragem radical: Lionel, o detestável arruaceiro ganha a lotaria e torna-se multimilionário. Agora, ele convive com a alta sociedade; mas aqui o autor surpreende-nos com a caracterização dessa elite que Lionel encontra no hotel onde se aloja; eles, os ricos cultivam a ignorância e idolatram a violência da mesma forma que a ralé a que Lionel pertencia antes; pobres ou ricos, os ingleses são ignorantes e brutos; parece ser esta a mensagem do autor. Sem dúvida uma crítica social mordaz e impiedosa.

A partir desta viragem no enredo, no entanto, o livro segue um rumo diferente, o ritmo narrativo abranda imenso e a prosa torna-se mais reflexiva e mais séria. A meu ver, isto faz com que a obra perca interesse e qualidade literária; perde-se a emoção e a vertigem narrativa da primeira parte; perde-se, em parte o humor satírico da primeira fase do livro, que se torna sério e às vezes mesmo maçador.

Fica, no entanto, a evidente qualidade da escrita do autor: clara, incisiva, rica em termos de vocabulário e, a sua principal qualidade, bem-humorada. A crítica é incisiva e mordaz; na narrativa “vemos” uma Inglaterra decadente e um povo inglês passivo perante os graves problemas sociais como a exclusão e a forte diferenciação social, a falta de cultura, o culto da violência e da pornografia – Martin Amis afirma que Lionel não consegue viver sem cadeia nem pornografia; a cadeia é vista como a sua segunda casa, de onde sai e volta a entrar com frequência; a pornografia é, para Lionel, a substituta das relações humanas, o que diz muito sobre a forma como Amis aborda este fenómeno social da autoexclusão e consequente refúgio em comportamentos marginais.

Em suma, um livro com muito interesse, bem escrito, que merece uma leitura atenta. E divertida.

sábado, 2 de julho de 2022

sexta-feira, 1 de julho de 2022

Leituras do Mês



- Charles Bukowski - Pulp 
- Martin Amis - Lionel Asbo 
- Elmore Leonard - Unha Com Carne 
- Alan Hollinghurst - A Biblioteca Da Piscina

quinta-feira, 30 de junho de 2022

sexta-feira, 10 de junho de 2022

Teste das Caricaturas de Escritores


Mais um desafio, desta vez para os amantes de literatura: tentem descobrir o nome dos 230 Escritores Caricaturados. No desafio anterior, o 10º teste de perguntas de literatura, deveriam tentar responder corretamente a 300 questões. Bastante menos exigente é este teste para identificar Caricaturas de Celebridades

Recordo que no Teste - Música é necessário identificar 100 artistas/bandas sobejamente conhecidos, no desafio Cinema - Qual é o Filme? devem tentar adivinhar o filme a que pertence a imagem ou então experimentar descobrir a que filme pertence um conjunto de Citações

Por sua vez, no teste 100 Obras de Arte devem tentar adivinhar o nome dos quadros e respetivos autores, no teste das 102 Personalidades devem identificar as 102 personalidades muito famosas de diversas áreas e também se podem aventurar a encontrar a solução para os 255 Quebra-Cabeças (Nº 8). Além disso, podem testar os vossos conhecimentos em quizzes de diferentes temas... (Disponíveis no separador "Testes" deste blog).

sábado, 23 de abril de 2022

quinta-feira, 7 de abril de 2022

Emily Jane White, Theatro Circo, 6 de Abril de 2022

Assisti ao belíssimo espetáculo que marcou o início da digressão portuguesa de cinco datas da cantora e compositora americana Emily Jane White no Theatro Circo. Este espetáculo teve como pretexto o lançamento dos álbuns “Alluvion” (este ano) e “Immanent Fire” (2019). 

“Alluvion” foi escrito e gravado durante os primeiros meses da pandemia com o produtor e multi-instrumentista Anton Patzner aos comandos. Um disco – o sétimo álbum de originais – que fala da dor pessoal e coletiva sobre a perda humana e do mundo natural, sugerindo um espaço de reflexão sobre a necessidade do luto. 

Mais banhado pela folk ou pelo rock, o repertório desta cantautora tem um misto de beleza etérea e nuvens cor de chumbo. Durante cerca de uma hora e quinze minutos foram apresentados temas daqueles dois álbuns mas também do seu álbum de estreia Dark Undercoat (“Dagger” e “Wild Tigers I Have Known” – esta última tocada sozinha ao piano depois de ter anunciado o fim do espetáculo e regressado à sala), do segundo disco Ode To Sentience ("The Cliff") bem como do quinto álbum They Moved In Shadow All Together (a encantadora “The Black Dove”).
O alinhamento das 15 canções foi o seguinte: 

1. Show Me The War 
2. Poisoned 
3. Body Agains The Gun 
4. Hold Them Alive 
5. Washed Away 
6. Dagger 
7. The Black Dove 
8. Heresy 
9. Surrender 
10. Crepuscule 
11. Dew 
12. The Hands Above Me 
13. Mute Swan 
14. Wild Tigers I Have Known 
15. The Cliff

sábado, 2 de abril de 2022

Louise Glück - Vita Nova


The master said You must write what you see,
But what I see does not move me.
The master answered Change what you see.



Esta edição bilingue da Relógio D’Água contém 32 poemas, sobre a primavera, a morte e recomeços, a resignação e a esperança. São poemas brutais, luminosos e clarividentes onde não se fazem grandes reivindicações. Louise Glück, Prémio Nobel da Literatura em 2020, parece não ter esperança no ser humano e nas vastas forças que o moldam e frustram.

Formalmente, a poesia de Glück raramente tem rima mas, para mim, a poesia, por quem a escreve bem, é bela e simples, não devendo ser encarada como algo intrincado, ininteligível ou hermético. Os meus poemas preferidos desta obra são Aubade, The New Life, Lament, Lute Song, Nest, Relic, Castile e este Immortal Love:

Like a door
the body opened and
the soul looked out.
Timidly at first, then
less timidly
until it was safe
Then in hunger it ventured.
Then in brazen hunger,
then at the invitation
of any desire.

Promiscuous one, how will you find
god now? How will you
ascertain the divine?
Even in the garden you were told
to live in the body, not
outsider it, and suffer in it
if that comes to be necessary.
How will god find you
if you are never in one place
long enough, never
in the home he gave you?

Or do you believe
you have no home, since god
never meant to contain you?

sábado, 26 de março de 2022

Sons da Primavera


1. MadrugadaNobody Loves You Like I Do 
2. Art School GirlfriendIn The Middle 
3. Foo FightersShame Shame 
4. London GrammarAmerica 
5. The StrokesThe Adults Are Talking 
6. Glass AnimalsI Don’t Wanna Talk (I Just Wanna Dance) 
7. The Chemical BrothersThe Darkness That You Fear 
8. Jack WhiteTaking Me Back 
9. KasabianAlygatyr 
10. Wet LegWet Dream 
11. TigerclubStop Beating On My Heart (Like A Bass Drum) 
12. LowertownSeaface 
13. Kings Of LeonWhen You See Yourself, Are You Far Away 
14. Black HoneyBack Of The Bar 
15. Peter Doherty & Frédéric LoThe Fantasy Of Poetry & Crime 
16. Cat PowerPa Pa Power 
17. The NationalSomebody Desperate 
18. Flower FaceCornflower Blue 
19. The Killer (Ft. Phoebe Bridgers)Runaway Horses 
20. Leonard CohenPuppets


 

terça-feira, 15 de março de 2022

Cinema do Mundo

 

- Wadjda (O Sonho de Wadjda), de Haifaa Al-Mansour - Arábia Saudita (2012)

Este é supostamente o primeiro filme a ser totalmente filmado dentro da Arábia Saudita contemporânea para além de, ainda mais miraculosamente, ser o primeiro filme de sempre a ser realizado por uma mulher dessa nacionalidade. Foca-se na história de uma jovem rapariga de 11 anos que sonha em ter uma bicicleta, para brincar com o seu amigo Abdullah, algo que lhe é proibido pelos pais e pela sociedade devido ao seu sexo.

O filme evidencia as características de uma sociedade baseada em tradições religiosas, à qual os ocidentais apenas imaginam como seria e também proporciona situações inimagináveis de restrições e preconceitos impostos às mulheres para o espectador tentar “digerir” e procurar, neste contexto, maneiras de viver com um mínimo de dignidade.




- La Historia Oficial (A História Oficial), de Luis Puenzo - Argentina (1985)

A narrativa deste filme centra-se na experiência de Alicia, uma professora argentina durante os anos 80, que começa a questionar as origens da sua filha adotiva e vai descobrindo os horrores da ditadura militar que ela, durante anos, tem vindo a ignorar. Suportado por um soberbo elenco, com especial destaque para Norma Aleandro e Chunchuna Villafañe, mostra como uma mulher foi cúmplice na criação da sua própria prisão de ignorância que, apesar de tudo, se mostra menos dolorosa que a necessária verdade. Assistir a “A História Oficial” torna-se um exercício de memória, e mostra que é preciso sempre discutir e falar sobre as atrocidades do passado, para que jamais se repitam os erros do passado.




- Maria Full of Grace (Maria Cheia de Graça), de Joshua Marston - Colômbia (2004)

Relata a experiência de uma jovem grávida colombiana que, depois de perder o seu emprego, se deixa seduzir pelas propostas de um cartel de droga, acabando por ser uma mula para eles. Com 62 preservativos cheios de cocaína no seu organismo, ela parte para Nova Iorque juntamente com outra rapariga. Joshua Marston filma todo este trajeto com particular intensidade, com destaque para as autênticas cenas de suspense no avião e no terminal de aeroporto.

"Maria Cheia de Graça" é um drama pausado mas pleno de intensidade, que aos poucos se vai insinuando e causando um discreto, mas violento, murro no estômago.




- The Lunchbox (A Lancheira), de Ritesh Batra - Índia (2013)

Este filme, já considerado de culto, passa-se em Bombaim e dá-nos uma visão diferente sobre a Índia e o dia-a-dia dos que lá vivem. Vale a pena ver o funcionário público, o Mr. Saajan Fernandes, e a dona de casa charmosa que nos transporta ao fabuloso mundo da comida indiana.

Saajan é um contabilista mesmo à beira da reforma. É viúvo e sem filhos, com uma existência solitária e melancólica. Um dia, o sistema de distribuição de lancheiras que, pelos vistos, existe na cidade, indo recolhê-las a casa e deixando-as no local de trabalho, engana-se e entrega-lhe uma que não lhe pertence. Saajan abre-a e encontra comida absolutamente fantástica…

Esta é uma história simples, de gente comum, passada numa cidade onde tudo é acelerado e num tempo onde já ninguém escreve à mão, mas envia e-mails, como alguém comenta no próprio filme. Mas estes anacronismos vêm sublinhar a diferença entre o amor clássico, pleno de emoções e subtilezas, onde o tempo alimenta a paixão, o oposto dos romances atuais, imediatos e de acentuado cariz sexual.




- Mies Vailla Menneisyyttä (O Homem Sem Passado), de Aki Kaurismäki - Finlândia (2002)

Um homem chega a Helsínquia num comboio noturno. Não sabemos o seu nome. Pouco depois da sua chegada ele é espancado com tal violência que perde a memória, esquecendo-se mesmo da sua identidade. Um início destes parece prometer mais tragédia que comédia mas neste filme a miséria humana é usada como ponto de partida para criar uma tapeçaria de comédia tão absurda como delicada. Humor unicamente escandinavo…

quarta-feira, 2 de março de 2022

Leituras do Mês

- Yrsa Sigurdardóttir - O Legado 
- Enrique Vila-Matas - Bartleby & Companhia 
- David Grossman - Um Cavalo Entra Num Bar 
- Chimamanda Ngozi Adichie - Meio Sol Amarelo

quinta-feira, 20 de janeiro de 2022

Ken Follett - O Preço do Dinheiro



Se há autor que tem galgado posições no meu top pessoal de preferências, esse autor é Ken Follett.

O grande senhor de "Os Pilares da Terra" e da "Trilogia o Século" é, aos 73 anos, um dos mais versáteis dos grandes ficcionistas contemporâneos. Poucos como Follett exploram universos ficcionais tão distintos. Depois de ter descoberto o imenso manancial proporcionado pelo romance histórico, Follett parece ter fixado aí o seu foco. No entanto, ao longo da carreira navegou por vários outros universos. E foi por isso que empreendi esta leitura com grande expetativa, tendo em conta que se trata de uma da primeiras obras de Follett. Aliás, este livro foi publicado em 1977 sob um pseudónimo diferente: Zachary Stone.
O caráter pioneiro deste livro fica bem patente numa abordagem algo ingénua, de um tema muito explorado: a criminalidade da alta finança, por oposição a uma pequena criminalidade quase desculpável e mesmo apresentada com alguma simpatia.

No entanto, este livro, escrito por Follett aos 28 anos, denota já alguns nítidos traços de génio. O primeiro desses aspetos é a visão bem nítida de uma comunicação social poderosa mas ao mesmo tempo sensível e exposta ao mundo da grande criminalidade. Fica claro que a Comunicação Social constitui um poder extraordinário na divulgação de factos e mesmo no desmascarar de criminosos mas, ao mesmo tempo, ela é o alvo prioritário dos grandes malfeitores; a grande criminalidade sabe que tem de controlar a comunicação social. O segundo aspeto interessante desse jovem escritor de 1977 é a análise psicológica e sociológica da pequena criminalidade, organizada em grupos de criminosos que não passam de “peões” perante os grandes criminosos de colarinho branco.

Globalmente, é um livro que se lê com muito agrado, uma daquelas obras que nos faz passar uma insónia agradável mas que, mesmo assim, nos pode explicar algo sobre o lado negro do sistema capitalista liberal; está em causa o poder das grandes finanças mas também a falta de ética de alguns senhores da grande finança que não hesitam em recorrer aos meios mais criminosos para atingir os seus objetivos.



domingo, 16 de janeiro de 2022

No-Vax DjoCovid: No Challenges Remaining

No-Vax: My Body, My Choice!

Australia: Our Country, Our Rules! Cheers!

 

 Game, Set and Dispatch! (CLICAR)

quinta-feira, 6 de janeiro de 2022

Leituras do Mês

- Jø Nesbo - O Reino 
- Hugo Van Der Ding - Vamos Todos Morrer 
- Ken Follett - O Preço Do Dinheiro 
- Paulo Ferreira - Miscelânea De Factos Essenciais E Curiosidades Inúteis Do Senhor Lubbock

quarta-feira, 5 de janeiro de 2022

Sons de Inverno


1. Nick Cave & Warren EllisWe Are Not Alone 
2. Wet LegChaise Longue 
3. PlaceboSurrounded By Spies 
4. Baby Queen & May-AAmerican Dream 
5. The LumineersBrightside 
6. Nilüfer YanyaStabilise 
7. Manic Street Preachers (Ft. Julia Cumming)The Secret He Had Missed 
8. Brad Pitt 
9. BastilleNo Bad Days 
10. The WombatsIf You Ever Leave, I’m Coming With You 
11. Sea PowerFolly 
12. Tears For FearsThe Tipping Point 
13. Franz FerdinandBilly Goodbye 
14. St. VicentDown 
15. Dave Gahan & SoulsaversMetal Heart 
16. Heartless BastardsWent Around The World 
17. LowWhite Horses 
18. Hamilton Leithauser & Kevin MorbyVirginia Beach 
19. GoatQueen Of Underground 
20. James Blake & Slowthai - Funeral